É um momento ingrato que acaba por acontecer na vida de qualquer leitor: a tarefa de arrumar a estante e escolher os livros que têm que ser postos fora de casa. No meu caso a separação não é assim tão dramática porque na verdade só preciso escolher os livros que não estarão comigo todos os dias já que os outros rumarão para as estantes da casa da minha mãe onde, na verdade, começo a construir uma biblioteca que um dia poderá contar a minha história enquanto leitora.
Ainda assim, escolher livros e pô-los dentro de caixas não é fácil, fico sempre com aquele sentimento de traição, de estar a pôr fora de casa um amigo.
Esta arrumação andava a ser pensada há algum tempo porque a minha estante tem pouco espaço e estava num estado miserável, com livros na vertical e na horizontal, com tudo misturado e sem espaço para mais nada (e como é óbvio há livros que preciso comprar).
Já tinha decidido que estava na altura de me separar de alguns livros de que tinham sobrevivido às últimas purgas e que na verdade não estou a pensar ler ou reler (falo, por exemplo, da minha colecção de livros da Marion Zimmer Bradley, da Isabel Allende ou dos policiais). Os livros que sabia que tinham que ficar eram os que ainda não tinha lido, que penso reler, que posso querer consultar nos tempos mais próximos e os técnicos (já só cá estão uma pequena amostra). Ou seja, só iriam ficar os essenciais.
Comecei a encher caixas. Foi fácil encher duas. Achei (inocente que sou) que isso seria suficiente para libertar o espaço e ficar com uma estante decente.
A fase seguinte é a da arrumação. Há quem arrume os livros por cores, há quem o faça por "lidos/não lidos", há quem arrume por ordem alfabética ou por editora. O meu critério é mais estranho (nunca vos disse que era normal, pois não?) e baseia-se na amizade. Este livro dar-se-ia bem com este; este autor ia gostar de estar ao lado deste. Sou incapaz de pôr ao lado de um dos meus livros preferidos um de que não goste ou de pôr ao lado de um escritor genial um que considero menos talentoso.
Às tantas comecei a aperceber-me que numa das prateleiras só tinha livros de mulheres portuguesas e não pude deixar de sorrir. Ficaram lá livros da Inês Pedrosa, da Rosa Lobato de Faria, da Maria Velho da Costa, da Ana Saragoça, Da Maria João Lopo de Carvalho, da Dulce Maria Cardoso, da Lídia Jorge, da Patrícia Muller, da Sophia de Mello Breyner, da Rita Ferro, da Hélia Correia e da Ana Margarida de Carvalho. Não são todos os livros que tenho de escritoras português (faltam lá algumas das minhas favoritas, que só tenho em ebook ou cujos livros estão emprestados ou em casa da minha mãe) nem todos os livros destas escritoras mas é uma amostra interessante.
O problema foi quando comecei a ficar sem espaço e com muitos livros ainda por arrumar. Confesso que entrei em pânico e tive que tomar algumas decisões dolorosas. Foram duas caixas muito difíceis de encher.
E nas próximas semanas tenho que tirar pelo menos mais 2 caixas de livros desta estante. Tenho que arranjar coragem para pegar nos livros que ainda não li e que não me parece que vá ler nos tempos mais próximos e levá-los para outra estante. Mas agora não quero pensar nisso.