A pequena comunista que nunca sorria, de Lola Lafon
Não, esta não é uma biografia romanceada de Nadia . Ou pelo menos não é uma daquelas biografias em que ouvimos a voz da biografada a cada linha, em que conhecemos pequenas curiosidades acerca da pessoa, a sua personalidade, a sua família ou os seus amigos. O retrato de Nadia Comăneci feito por Lola Lafon deixa-nos com mais perguntas que respostas. Por isso não lhe chamaria uma biografia romanceada. Sim, há notas biográficas e, sim, há alguma ficção, a que eu também não chamaria ficção, antes interpretação. Ao longo da leitura vamos assistindo ao esgrimir de argumentos entre Lola e Nadia, à tentativa da escritora de conseguir informação da ginasta e à tentativa de Nadia de controlar a narrativa. Pessoalmente agradou-me o estilo e o todo.
Adoro ginástica. E os aparelhos em que Nadia C. se tornou lenda, a trave e as paralelas, são os meus preferidos. Aquele(s) “perfect 10” é uma maravilha e confesso que quando estou a ver os vídeos não penso no que foi preciso para o atingir (gostamos de acreditar que é só talento e muito trabalho) nem nas consequências físicas, mentais e (neste caso) políticas de tal. E é disso que este livro trata. Talvez por isso despache o mais icónico momento protagonizado por Nadia C. nas primeiras páginas: o momento em que a máquina foi vencida por uma menina de 14 anos, perfeita. Depois vem o como, os porquês, o antes e o depois.
É uma leitura dura, com o nosso olhar “sec XXI” olhamos para aquelas práticas, em plena guerra fria, como algo inimaginável, sofremos com aquela menina. E ouvimos as suas palavras em adulta acusando-nos de hipocrisia, ouvimos a sua defesa das práticas, do objectivo, do sucesso obtido. Perguntamo-nos a cada página pela sua saúde mental, pela força necessária para sobreviver àquilo tudo, pelas suas reais convicções. Perguntamo-nos qual o grau de ficção e de verdade do que aqui nos é contado, mas nunca, nunca perdemos o interesse.
Foi uma óptima leitura.