Nem sequer era sobre isto que vinha escrever
Choque, surpresa e a necessidade de admitir que uma parte (substancial) do país tem convicções opostas às minhas. Não é que não o soubesse mas a realidade fez questão de o dizer à bruta. E não é que o país tenha mudado no domingo, talvez se tenha revelado um pouco mais, apenas isso.
Nunca fui a pessoas que achasse que os 50 deputados do Chega lá estivessem por causa de um voto de protesto. Tenho a tendência a não achar que toda a gente é meio burrinha e sempre achei que cada votante sabia exactamente o que estava a fazer e que, de uma forma consciente, tinha escolhido representantes do partido que defende valores xenófobos, machistas e racistas. Comprovou-se que o comportamento absolutamente desprezível que estes deputados demonstraram ao longo do último ano na assembleia da república - com insultos pejados de ódio e discriminação - é aquele em que se revêem tantos portugueses. E é isso que mais me entristece.
Ao longo destes dias tenho pensado bastante. Como chegámos aqui? Não estou a falar de razões políticas - essas não são difíceis de encontrar para quem tiver vontade de sair um bocadinho da bolha. Estou a falar de comportamentos e valores. Quando é que passou a ser normal e aceitável ter um discurso de ódio? Quando é que passou a ser normal insultar impunemente? Quando é que passou a ser aceitável defender a prisão perpétua ou a castração química? Quando é que deixámos de lado, abandonámos, a gentileza e a bondade?
O mundo está virado do avesso e nada disto já me devia surpreender - e o mais triste é que nem sequer surpreende muito, a maldade está a normalizar-se nas nossas vidas.
Por mais voltas que dê acabo sempre no mesmo sítio, na certeza que a gentileza é a única forma de luta dos próximos tempos. E não vai ser fácil. Acho mesmo que ser gentil passou de moda por ser tão difícil sê-lo.