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Ler por aí

Ler por aí

30
Jul24

Estação onze, de Emily St. John Mandel

Patrícia

estação onze.jpg

A primeira coisa que tenho que dizer é que este é um livro escrito em 2014, bem antes da Pandemia de covid-19 que, de uma ou de outra forma, marcou a vida de todos os que estão a ler este post. Será certamente diferente lê-lo antes ou depois da época que mudou a forma como vemos o mundo (infelizmente não nos tornou pessoas melhores mas isso é outra história).

No início de Estação Onze percebemos logo que uma epidemia provocou o fim do mundo. Pelo menos o fim do mundo como o conhecemos. Em apenas alguns dias o mundo ficou reduzido a uma ínfima percentagens dos seus habitantes. Não houve tempo para adeus, para fugas, para despedidas. Mas antes disso havia um teatro onde estava em exibição King Lear, protagonizado por Arthur que morre em palco. Apesar de sair de cena no primeiro acto, é Arthur a peça central deste livro e vezes sem conta voltamos atrás e conhecemos as histórias, as histórias dos que o rodeiam e a forma como sobreviveram ou não ao fim do mundo. Kirsten é uma menina-actriz que faz de fantasma de uma das filhas do Rei Lear e cuja vida é marcada por Arthur, acima de tudo por acaso, porque as circunstâncias assim o ditam. Na mesma noite em que vê o seu amigo morrer em palco, regressa a casa para a ausência dos pais, apanhados pela gripe que em poucas horas devastou o mundo, e é o irmão que a ajuda a salvar-se. Vinte anos depois, Kirsten atingiu o sonho de ser actriz e é com Sinfonia Itinerante que vai percorrendo o mundo (que se cinge ao espaço que se consegue percorrer e pé) sob o mote de "sobreviver não é suficiente..."

Apesar de nos fazer um retrato bastante interessante do mundo pós apocalíptico (e já aprendemos que a realidade supera muitas vezes a ficção), estação Onze, como qualquer bom livro de ficção, trata de gente, de relação entre gentes, de amizade, de mudança, de crescimento. Como se vive com a culpa do sobrevivente? Em quem nos tornamos quando a necessidade de sobrevivência se impõe? Como funciona a sociedade sem regras, sem líderes, sem organização? Sem necessidade de muitas páginas (este é um livro surpreendentemente curto para o género), a escritora consegue abordar uma série de questões interessantes. 

Não é um livro perfeito (para mim acaba por ser demasiado simples, queria saber mais, conhecer melhor aquelas pessoas, perceber o seu crescimento e não ser-lhes apenas apresentada no final) mas é um bom livro para passar umas horas.

26
Jul24

E hoje, algo totalmente diferente...

Patrícia

"mulher ao volante, perigo constante"

Quantas vezes não ouvimos esta piadola? muitas, demasiadas. Felizmente as seguradoras não concordam e essas trabalham sempre com factos e probabilidades. E são como o outro, nunca têm dúvidas e raramente se enganam.

Lembro-me da primeira vez em que, orgulhosa do carro novo - um fofo Mitsubishi Colt Cz3, azul e outro - fui a condutora que levou a malta do escritório ao restaurante. Quando chegámos perto vi um lugarzinho e estacionei. Não seria nada de especial, não fora o espanto do meu chefe que se saiu com um "e não é que conseguiste estacionar aqui? nunca pensei". Foi uma constante ao longo da vida, esse espanto por eu conseguir estacionar em lugares onde mal cabia o meu carro. 

Sempre achei que esse preconceito tinha passado mas nos últimos tempos passei por duas situações que me deixaram lixada. 

No ano passado, pouco tempo depois de ter feito a revisão do carro, comecei a reparar num barulho que não era normal. Fui à oficina, expliquei a situação e pedi para verificarem. O mecânico, com um ar muito gozão, diz-me "não será o barulho do cinto do passageiro que está dobrado?". Eu disse-lhe que não, que o cinto tinha ficado assim porque o meu marido tinha saído há pouco do carro e tinha ficado assim mas vi-lhe na expressão aquela pena de quem se sente superior e que tinha sido ali taxada de "mulher ao volante, perigo constante", a burrita que entra em pânico por uma mão cheia de nada. Não surpreendentemente, o diagnóstico foi "está tudo bem, vá descansada" com o "agora que o cinto está direito" não dito mas pensado. Como podem imaginar, saí dali para outra oficina onde o mecânico me levou a sério, foi dar uma volta comigo, ouviu o barulho e, de volta à oficina, pediu-me para esperar um pouco. Passado uns minutos perguntou-me quem raio tinha mudado as pastilhas do travão porque um dos parafusos tinha ficado mal apertado e tinha saltado. Mulher 1, mecânico machista 0. Houve reclamação, claro. Não foi bonito.

Há umas semanas, estava eu no pára-arranca da segunda circular quando o pedal da embraiagem bloqueou. Chamei o reboque, esperei uma hora e quando o reboque veio o moço entrou no meu carro e voilá, o pedal funcionava. Olhou para mim e disse-me que estava tudo bem e o ar de "mulher ao volante, perigo constante" surgiu-lhe no focinho. Eu perguntei-lhe "ok, agora funciona, há pouco não, o carro vai para a oficina". A dúvida dele era "mas o que ponho na razão para ir para a oficina? tudo funciona" e o ar, senhores, o ar de paternalismo que me tira do sério. Limitei-lhe a dizer que o carro não estava seguro, que escrevesse a verdade "o pedal da embraiagem bloqueou" e que estava fora de questão aquele carro voltar a andar sem ser visto. A pipa de massa que paguei para mudar as peças necessárias (felizmente não foi preciso mudar a embraiagem completa) deu-me nova "vitória". Mulher 1- motorista machista 0.

Tivesse eu sido menos confiante e em qualquer um dos dois casos poderia ter tido acidentes graves só porque não fui levada a sério. E não fui levada a sério, apesar conduzir de forma regular há mais de 20 anos, por ser mulher. 

E não, não sei muito de mecânica. Aliás, a única mecânica que alguma vez estudei foi a dos aviões e já lá vão uns anitos mas sei quando alguma coisa está errada no meu carro. E o mínimo aceitável é ser levada a sério. Porque o perigo é não o ser.

 

(um dos poucos posts neste blog que não versa sobre livros mas só para vos provar que até aqui eu conseguiria meter o tema livros, tenho que confessar que naquela hora em que esperei pelo reboque e fazia fila na 2ª circular, saquei do kobo e li umas páginas sempre que não estava com receio que um tipo qualquer ignorasse o triângulo e se espetasse contra o meu carro parado)

14
Jul24

Livros a aproximar pessoas

Patrícia

É provável que me esteja a repetir mas cada vez que acontece é como se fosse a primeira vez. Não sou uma pessoas propriamente tímida (mas há quem diga que sou bastante introvertida) pelo que não tenho grande problema em manter uma conversa com quem quer que seja. Esta semana tive um evento de trabalho que me obrigou a estar à conversa com um miúdo inglês que me surpreendeu bastante. E como sempre acontece comigo (vá-se lá perceber porquê), a conversa acabou por passar pelos livros. Ebooks, audiobooks e livrarias, acabou por ser bastante agradável e, acima de tudo, bastante fácil ficar ali à conversa. É tão bom encontrar os nossos.

14
Jul24

Kafka à Beira-mar, de Haruki Murakami

Patrícia

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Tinha para ler este livro há nem sei quanto tempo. Provavelmente comprei-o pouco depois de me ter apaixonado pelo 1Q84 só que foi ficando na estante à espera de vez. Ora, a vez dele chegou e vou já dizendo que gostei mesmo muito. É bom ler a estranheza do eterno aspirante ao nobel e mergulhar naquele mundo tão parecido com o nosso mas ligeiramente diferente e achar tudo normal? Chovem peixes? Normal (isto não conta como spoiler, toda a gente sabe); há miúdos a cair para lado sem razão aparente? Tudo bem, só queremos saber porquê. Os gatos falam? Bem, eu falo com os meus todos os dias, tenho a certeza que me entendem.

Rapidamente, muito rapidamente, entramos naquele mundo e acompanhamos Nakata na sua busca pela gatinha chamada Goma e depois na sua demanda para lá do seu mundo, e acompanhamos o rapaz que se auto-denomina Kafka, na sua busca pela biblioteca perfeita. Talvez devesse dizer “na sua busca pelo seu lugar no mundo” mas dizer assim “a busca pela biblioteca perfeita” é quase a mesma coisa. Num livro em que saltitamos de história para história é inevitável que uma delas nos atraia mais. Acho que é inevitável que Nakata nos atraia. Afinal este velho (se é que se pode chamar a alguém com os seus 70 e tais anos de velho), analfabeto, com alguma deficiência mental é a imagem da bondade e da inocência. É fácil sentir empatia e perdoar-lhe tudo, sentindo nas páginas que o retratam a ausência de mal. Já Kafka tem uma história de altos e baixos em termos de interesse (pelo menos para mim), e apesar de ser interessante a história da profecia edipiana de que foge, a forma como tudo se resolve tem os seus "quês".

Ainda assim, gostei muito de entrar neste mundo de música e de realidades alternativas que Murakami nos traz em Kafka à beira mar. Tenho, no entanto, a sensação que preciso reler este livro para o compreender melhor. 

 

02
Jul24

interlúdio

Patrícia

Chega o meio do ano (como é que já passou meio ano se ainda agora estávamos a escrever 2023 nas datas? juro que o tempo corre a uma velocidade cada vez maior) e com ele uma espécie de balanço. Tem sido um ano estranho de leituras, tenho a sensação de que pouco ou nada li mas os números dizem outra coisa e não são assim tão baixos. Nisto o que conta é a intenção ou melhor, a percepção. Li pouco, apesar de ter havido dias ou semanas em que li bastante. É verdade que poderia ter lido mais mas também é verdade que li o que me apeteceu. Retrospectivamente gostava de ler lido mais, sei que algumas das noites que passei a ver séries de que já nem me lembro poderiam ter sido passadas a ler mas o cansaço (físico mas sobretudo psicológico) não o permitiu. 

A percepção de que li pouco tem muito a ver com a qualidade das leituras que fiz. Enquanto livros como o Anna Karénina, o Amor estrado ou Kafka à beira mar me encheram as medidas outros houve que me desiludiram. E, infelizmente, neste semestre houve mais do que um destes. 

Eu sei que a minha incapacidade para desistir de um livro é um problema. Há tantos livros, para quê perder tempo quando sei que aquele livro não é para mim? Quem me conhece sabe a resposta que dou meio a sério, meio a brincar: só posso falar mal de um livro que li até ao fim. Sinto sempre que sou injusta se não terminar aquele livro. O fim pode salvar um livro. Não sou capaz de dar nenhum exemplo mas tenho a certeza disto. Ou pelo menos espero que seja verdade. 

Nestes meses perdi muito tempo com erros de casting. 

A segunda metade do meu ano vai ser dedicada à fantasia. Hei-de reler (pela terceira vez se não me falha a memória) o The Way of Kings, do Brandon Sanderson, só porque vai, finalmente, sair a tradução portuguesa (não se preocupem, ainda ouvirão falar muito sobre isto) e hei-de acabar o ano a ler o quinto volume desta mesma série que vai sair dia 06 de Dezembro (sim, tenho na agenda) na versão original. O que vou ler entre um e outro é um mistério mas não me há-de faltar escolha.

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