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Ler por aí

Ler por aí

16
Jun23

"Subitamente, sós", de Isabelle Autissier

Patrícia

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A premissa é simples. Louise e Ludovic ficam presos numa ilha deserta e, para sobreviver, têm que se reinventar. Situações extremas pedem soluções extremas. Desengane-se quem espera uma aventura ao género de Robinson Crusoé ou de Tom Hanks enquanto náufrago. O único livro que me veio à memória enquanto lia este “subitamente, sós” foi o “A ilha de Sukkwan” de David Vann, apesar deste ser bastante mais negro e opressivo que o livro da Isabella Autissier. Ou talvez a diferença esteja em mim, na minha predisposição ao lê-lo.

Louise e Ludovic são tão diferentes quanto duas pessoas o podem ser. Ela, tímida, fechada, vive para as montanhas mas não consegue fazer do alpinismo a sua forma de vida porque a família considera não ser essa uma profissão adequada.  O que falta de confiança a Louise, Ludovic tem em excesso. A autoconfiança que vem da beleza, do amor e da certeza que alcançará tudo aquilo a que se propõe. Dois seres diferentes que se atraem e se completam. Depois de embarcarem numa volta ao mundo a dois, acabam por ficar presos numa ilha do pólo sul, sem nada mais que a mochila de montanhismo de Louise.

Boa parte do livro conta a história de sobrevivência, da desumanização e da sorte/força/coragem necessária para fazer o possível para não perder a luta contra os elementos. Interessante quanto baste. Na segunda parte do livro, o regresso. Passamos a ler sobre a dificuldade de sair do “modo de sobrevivência” e a forma como a sociedade actual “vive” este tipo de história.

A verdade é que quer na primeira parte, na luta pela sobrevivência, quer na segunda, na forma como se sobrevive à “sobrevivência”, achei esta uma história contada pela rama. Entre muita “palha”, muitas cenas risíveis, há outras que, bem desenvolvidas, podiam ter feito deste um livro especial. Infelizmente não senti, enquanto leitora, que isso tivesse sido conseguido. A história está lá mas o foco não foi o mais certeiro. O que aconteceu com o navio de cruzeiro, por exemplo, não se percebe. Se há coisa que aqueles dois tinham era tempo e não estarem coordenados naquele ponto específico não me convenceu. Pareceu-me apenas uma forma de chegar àqueles “durante e depois”. E teria havido tantas outras formas de provocar aquela situação. Noutro ponto, a parte mais interessante da segunda parte seria o pós-revelação mas, miraculosamente e depois de “engonhar” por páginas e páginas, chegamos ao final certo mas sem perceber muito bem porquê ou que acontecerá depois, um final decidido de forma unilateral quando nada naquela história o poderia ser.

11
Jun23

No Jardim do Ogre, de Leila Slimani

Patrícia

no jardim do ogre.jpeg

É difícil falar deste livro. Mas é um livro que merece ser falado, discutido. Sei que a maioria não concordará comigo mas gostei mais do No Jardim do Ogre que de Canção Doce. Se não leram, aconselho a que não continuem a ler este post, haverá certamente spoilers neste texto. Mas a sinopse tb revela muito, demasiado, acho. E não acreditem na frase que diz que isto é, no fundo, uma história de amor. Não é nada, é o contrário disso.

Esta é a história de duas pessoas infelizes, que tentam desesperadamente encaixar-se numa sociedade que não as aceita como são. Ou melhor, esta é a história de duas pessoas que não se aceitam como são e que vivem profundamente infelizes na sua própria pele. É-nos mais fácil (ou imaginar) os porquês da Adèle, de onde veio aquela falta de segurança, como amor e violência se misturaram naquela cabeça. Também nos é mais fácil criticar as atitudes de Adèle. E até mais fácil ter pena de Adèle. Mas Richard não é melhor que ela. Nada naquela casamento funciona, a começar pelo sexo e a passar por todas as outras coisas importantes numa relação. Aliás, nenhum dele devia estar numa relação. Ou melhor, qualquer deles poderia estar numa relação com alguém que quisesse o mesmo. Que compreendesse e aceitasse a necessidade de violência que Adèle sente. Que aceitasse a relação asséptica que Richard pretende. Que aceitasse a totoal ausência de sentimentos numa relação. Mas não podiam estar numa relação um com o outro.

Como habitualmente li algumas opiniões sobre este livro e sinto que não li as mesmas palavras que a maioria das pessoas. "Ninfomania", "Pulsão sexual", "Desejo". Não foi nada disso que aqui li. Não é um livro sobre desejo. Não é o prazer sexual que Adèle procura. Nem sequer é prazer que ela procura (antes fosse). Pulsão, sim, mas pouco sexual. A violência, a dor e, acima de tudo, a humilhação são a verdadeira pulsão. Procura-as como confirmação da opinião que tem de si mesma . Não consegui sequer achar que Adèle gostava de sexo. Talvez seja um lugar comum dizer que ela pretendia acima de tudo ser "vista" mas fiquei com essa sensação (aliás, quando é descoberta sente efectivamente alívio). Infelizmente para ambos, a raiva em Richard toma a forma de possessão. Uma das coisas que me impressionou foi que, quando descobre a traição, uma das primeiras frases que lhe sai é "nunca mais vês o teu filho, vou tirar-to". Tão típico. Tão verdadeiro. Tão triste. E o "perdão" vem com toda uma forma de tortura e violência mansa que me arrepiou. 

08
Jun23

As Primas, de Aurora Venturini

Patrícia

 

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Nos primeiros capítulos, o choque e a estranheza. Foi bom ter começado a ler este livro às escuras, sem nada saber sobre ele.

(num aparte, acho que esta é a desvantagem de toda a informação/comunicação à volta dos livros, raramente nos surpreendemos, já sabemos pelo menos o que esperar daquele livro porque já lemos inúmeras opiniões, exactamente iguais a esta, e que, mesmo sem spoilers já nos prepararam, já criaram expectativas, já nos condicionaram a leitura. No fundo acontece o mesmo quando lemos um primeiro maravilhoso livro de um escritor – por muito bom que seja, nunca mais é como na primeira vez)

Dizia eu que primeiro foi o choque e a estranheza. Num tempo em que a linguagem é cada vez mais pensada, higienizada, tornada socialmente correcta e aceitável, temos neste livro o claro exemplo do poder da linguagem. O poder da linguagem. O poder da literatura. A forma como a literatura consegue fazer-nos sentir, como consegue fazer-nos visualizar, como nos transmite tanto a beleza como a repulsa. Posso esquecer a maioria por pormenores desta história mas dificilmente esquecerei como me senti ao lê-la.

Yuna conta-nos a sua vida e a vida daquela família estranha. Aquelas histórias, pelos seus olhos, pelas suas palavras, pela sua voz que cresce e se desenvolve nas páginas daqueles livros. Eu confesso que não sei bem o que é um livro de “personagem” mas, o que quer que seja, este parece sê-lo: Yuna cresce sob o nossos olhos, transforma-se, engrandece. Não é um livro fácil, nem pretende sê-lo, nem é um livro que leve o leitor pela mão – e ainda bem.

 

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