Beloved, de Toni Morrison
Que livro!
Duro, triste, que nos envergonha.
A história de Sethe e Denver em 124 bluestone road, uma casa assombrada pelo fantasma da irmã mais velha de Denver é muito menos uma história de fantasmas que o retrato do pior que a humanidade tem.
Quando começamos o livro, Denver tem 18 anos e é uma menina tímida, introvertida, fechada ao ponto de questionarmos as suas capacidades. Sethe, uma mulher forte, ex-escrava, com uma árvore nas costas, que tem a audácia de ser capaz de sobreviver sem precisar dos outros. Depois, por vezes de uma forma lenta, outras de uma forma vertiginosa, vamos conhecer-lhes a história, o passado, o acontecimento inominável que lhes condiciona o presente.
Cedo conhecemos esse acontecimento que revisitamos ao longo do livro sob várias perspectivas. Não senti este como um livro de redenção mas de assombro. Qual o caminho para a desumanização total a ponto de alguém ter aquele género de atitude? Não foi a presença de Beloved que me assustou ao longo destas páginas, foi a capacidade do ser humano de desumanizar os outros, de os humilhar, violentar, destruir a ponto de tornar (quase) justificável o injustificável.
Denver é, também, uma personagem muito interessante. O ser percurso, as suas motivações que, às páginas tantas, se tornam claras e acabam por nos surpreender. Gostei que Denver se tivesse tornado a luz deste livro.
É muito interessante analisar porque é que o acto de Sethe se torna imperdoável e perceber que nem sempre é pelas razões que, à partida, pensaríamos ser. Já mesmo no final no livro quando Ella confessa que pior que o que Sethe fez é ela ter tido a audácia de sobreviver sem ajuda. O orgulho como acto imperdoável é bastante interessante, especialmente vindo de quem percebe melhor que ninguém o que é a humilhação e ainda assim a exige dos outros. As motivações de cada um são um ponto secundário mas crucial nesta história.
Ao contrário de vários comentários que fui lendo não achei este um livro difícil de ler. Duro no conteúdo mas não na forma. Apesar de não ler uma histórias linear não tive dificuldade em seguir a história, em perceber o tempo em que estava. Sei que existe um filme baseado neste livro mas, sinceramente, não me parece que haja forma de fazer jus às várias dimensões desta história em filme pelo que não me parece que o vá ver.
Beloved é, de facto, assombroso e maravilhoso. Um livro incontornável.