21
Jan15
Dispara, eu já estou morto, de Júlia Navarro
Patrícia
Para contar o presente é, às vezes, necessário relembrar o passado. É necessário rever todos os pequenos acontecimentos que ajudaram a construir este presente e são os alicerces para o futuro. A bem ou mal.
Para contar a história do conflito Israelo-palestiniano a escritora vai lá atrás. Não ao ponto onde começou esta história, isso ainda é bem mais atrás, atrás mesmo da expulsão dos judeus da Península Ibérica, antes da "criação" dos cristãos-novos. É inevitável estabelecer a barreira dos 2000 anos. Mas, sem ir tão longe assim, a escritora foi à Russia dos Czares, falar-nos dos pogroms e apresentar-nos a uma família de Judeus que só queriam sobreviver e ser considerados gente antes de serem considerados Judeus.
Entre a Rússia e Paris acabam por ir parar à Palestina, terras secas e áridas do império Otomano, onde Árabes e Judeus conviviam há muito.
Na capa do livro fala-se de duas famílias em luta contra o destino. Não acho que seja verdade. É apenas uma família. Uma família de coração, forjada no socialismo saudável e generoso da Horta da Esperança. Uma família, amizades verdadeiras e indestrutíveis, formada por árabes e por judeus.
Mas as escolhas destas família acabam por ter que ser um reflexo das escolhas de dois povos desesperados por pertencerem a um lugar. Para os Palestinianos, aquela é indiscutivelmente a sua terra, sempre ali estiveram. Para os Judeus há um momento para dizer chega e cansados de serem constantemente expulsos de todo o lado, é o "para o ano em Jerusalém" que prevalece.
Há momentos duríssimos neste livro. Quem já é leitor habitual de Julia Navarro sabe que ela não é meiga a mostrar-nos cenas do Holocausto. Fê-lo na Bíblia de Barro e também em Diz-me quem sou. Mas confesso que as páginas deste livro referentes à Segunda Guerra Mundial são muito mais que murro no estômago.
Mas este livro está longe da perfeição. Quem procura uma boa história poderá ter dificuldade a encontrá-la tendo em conta que há dezenas de personagens e de acontecimentos verídicos no meio de ficção. A verdade é que, às paginas tantas, já não sabia quem era quem e tinha mesmo que me pôr a pensar se aquele era Árabe ou Judeu, filho, marido ou irmão de quem, quais as suas peculiaridades e se valia ou não a pena voltar atrás para descobrir.*
A estrutura também não ajuda, há o presente, o passado de uns e o passados dos outros, vozes diferentes mas com um tom demasiado parecido.
Não percebo nada de estruturas narrativas mas, digo eu, se o narrador não é omnisciente e pretende apenas relatar o que viu, ouviu ou lhe contaram, convém ter cuidado e não deixar pontas soltas como relatar pormenorizadamente um homicídio que ninguém sobrevive.
Ainda assim este é livro que adorei ler, com o qual aprendi imenso e que vale a pena ler.
*há um esquema dos personagens muito giro no Goodreads, vão lá ver, só não o ponho aqui porque não consegui um link que mostrasse apenas de quem era