17
Out15
Gente Feliz com Lágrimas, de João de Melo
Patrícia
Qualquer leitor terá os seus livros marcantes. Livros que os mudam enquanto gente, que os obrigam a crescer enquanto leitores e fazem com que todos os livros que depois chegam à sua vida sejam "julgados" de uma forma mais crítica. Foi isto que este livro fez por mim. Mudou-me enquanto leitora.
Levei mais de um mês a lê-lo e isso, por si só, é estranho. Mais estranho ainda é não ter pensado, em nenhuma das quase 500 páginas, em desistir, fechá-lo e deixá-lo abandonado na estante. Depois de ter iniciado esta leitura era impossível deixar estar história fechada dentro de um livro.
Muitas vezes foi difícil. A maravilhosa escrita do João de Melo não disfarça a violência, a tristeza, a angústia e acima de tudo a falta de esperança desta gente que procura a felicidade sem deixar as lágrimas de lado.
Tudo o que possa dizer acerca deste livro será redutor, basta pensar que a 25ª edição mostra que já venceu a prova do tempo, dos leitores de todas as idades e da crítica. Quanto a mim fico feliz por ter superado esta leitura e fico orgulhosa por, uma vez mais, constatar que tão bem se escreve em Português.
Este é um livro com muitas vozes apesar de ter em Nuno, no seu percurso, um fio condutor. Nuno, o gémeo que contra todas as expectativas, sobreviveu, viveu os primeiros anos de vida (a que dificilmente se pode chamar infância) num inferno perdido numa ilha dos Açores. Sob o jugo de um homem violento e de uma mãe execrável (e é a "mamã" que eu não consigo compreender, perdoar) vê na vinda para um seminário do continente a fuga impossível a uma vida miserável. Nuno e Amélia (uma menina-mulher que nem o deus do convento soube apoiar) pagam caro o preço da fuga à vida de trabalho e ignorância a que o patriarca da família os tinha destinado.
Relato emotivo ou documento histórico, este é sem dúvida um livro para ler pelo menos uma vez na vida.