Pai Nosso, de Clara Ferreira Alves
Mas livrai-nos do mal
Amén
Ao contrário do que li por aí esta foi, para mim, uma leitura compulsiva. Tivesse tido tempo e teria lido este livro de uma assentada.
Não sei do que estava à espera mas não era disto. Fiquei presa a este livro nas primeiras páginas e não me cansei em nenhuma página. Nem a (quase) total ausência de notas de rodapé, que tão necessárias teriam sido neste livro, nem a dureza das palavras ou a dificuldade em contextualizar nomes, lugares e acontecimentos fizeram esmorecer a vontade de persistir na leitura.
Não sou a maior fã da Clara Ferreira Alves, não concordo com ela inúmeras vezes e não sou uma leitora fanática das suas crónicas. Mas, sem dúvida, que este Pai Nosso me fez mudar, em parte, a opinião que tenho dela.
Comprei este livro num impulso depois de ter ouvido a entrevista que deu ao Carlos Vaz Marques no Pessoal e Transmissível da TSF (tem um spoiler imenso, não aconselho a que oiçam antes de ler o livro - como raio é que um autor se descai daquela maneira é algo que não consigo compreender - infelizmente parece que está na moda). Mas sei que o iria comprar pela capa, pelo título. Capa magnífica. Só tem, para mim, um defeito. O nome da escritora está demasiado grande. Mas a verdade é que este é um livro da CFA. Juro-vos que "ouvi" este livro com a sua tão característica voz.
A história de Maria, uma fotógrafa de guerra conhecida como "O fantasma", é-nos contada na primeira pessoa. Com ela viajamos de Lisboa a Jerusalém, de Cabul a Londres. Com ela sentimos, amamos, odiamos. Pelos seus olhos conhecemos personagens inesquecíveis, reconhecemos personagens que de ficção parecem ter pouco, sentimos o cheiro do mar ou o calor do deserto. De guerra em guerra, de foto em foto, percebemos o que move aquela mulher e conseguimos imaginar no que pensa enquanto fuma um cigarro e bebe um copo de gin.
Sim, é uma história sobre terrorismo. A guerra chegou à Europa. A maioria de nós lembra-se de tudo (mesmo que apenas menos do que um pouco de tudo) desde a Guerra do Golfo até aos ataques do Daesh que marcam o nosso presente. E este livro veio relembrar-nos, preencher lacunas, questionar-nos uma e outra vez. E mais uma ainda. E contar-nos, não uma, mas muitas histórias.
Clara Ferreira Alves não perde o tom de jornalista, de cronista mas atinge, enquanto romancista, a voz que eu prefiro ouvir. Sempre gostei de aprender nos livros. De partir da ficção para a realidade. Ou da realidade para a ficção. Neste livro, ambos acontecem.
Rendi-me.